sexta-feira, março 21, 2008

Primeiro filme Timorense

Graças a João Paulo Esperança, um ex-professor que trabalhou em Timor, ficamos a saber do lançamento do primeiríssimo filme Timorense, intitulado "Sirana". O filme lida com várias temáticas, como os relacionamentos, violência doméstica, adolescência, conflitos de classes sociais em Díli, o impacto da presença internacional no território ou a linguagem.

Realizado por Ivete de Oliveira, o filme assenta na improvisação, suportado no estilo documentário. Uma crítica mais aprofundada a Sirana, bem como o respectivo trailer podem ser visualizados AQUI.

Sérgio Lopes

segunda-feira, março 17, 2008

Unknown Pleasures (Ren xiao yao)


China/Coreia do Sul/Japão/França, 2002, 113 min.

Página Oficial - Trailer - Fotos


Sinopse: Xiao Ji (Wu Qiong) e Bin Bin (Zhao Wei Wei) são dois amigos a viver numa pequena cidade chinesa. Qiao Qiao (Zhao Tao) está apaixonado por uma dançarina e Bin Bin namora com uma estudante que pretende ir para a universidade. Os seus dias passam-se sem grandes novidades e sem grandes perspectivas de futuro.

Crítica: Unknown Pleasures é a terceira longa-metragem de Jia Zhang-ke, rodada em 19 dias com um orçamento baixo e sem autorização estatal, ou seja, trata-se ainda de uma obra “underground” que não pôde ser exibida legalmente nas salas de cinema chinesas.
O título do filme é retirado de uma canção que se ouve em vários momentos deste e faz referência aos “prazeres desconhecidos” do Ocidente, nomeadamente a dita cultura pop, que invade a vida dos jovens do filme sem que isso lhes traga quaisquer benefícios ou particular satisfação. Xiao Ji veste-se como qualquer jovem ocidental, tem um corte de cabelo estiloso mas passa os seus dias vagueando pelas ruas, muitas vezes em busca de Qiao Qiao, uma rapariga que conhece a dançar num concurso publicitário e que é sevaramente controlada por um homem mais velho. Bin Bin é um jovem igualmente desocupado, cuja namorada aspira a entrar na universidade para estudar Comércio Internacional. As perspectivas de futuro da namorada, em tudo contrastantes com as suas, e as críticas da mãe, que o considera um inútil, levam-no a tentar alistar-se no exército mas é impossibilitado de o fazer quando descobre ter hepatite.

Unknown Pleasure foi, tal como os dois primeiros filmes de Jia, filmado em Shanxi, na cidade de onde o realizador era originário. O filme é um retrato notável da juventude chinesa das cidades pequenas, com muito do Ocidente ao seu dispor mas sem utilidade a dar a tudo o que tem acesso. Apáticos, vivem os dias sem grande ânimo ou convicções. Esse desinteresse está bem patente nas várias cenas em que são mostradas notícias televisivas reportando problemas com os EUA ou com com as Falun Gong, às quais as personagens não prestam grande atenção.
A incomunicabilidade está bem patente na cena em que Bin Bin e a namorada estão sentados lado a lado no sofá sem sequer olharem um para o outro e sem conseguirem manter um diálogo substancial. A forma que encontram para “falar” é cantar em uníssono uma canção em karaoke na televisão.


Apesar de representar um olhar crítico sobre a ocidentalização da China, em particular junto dos jovens, o filme adopta um aspecto particular de várias obras que se tornaram marcos da cultura ocidental contemporânea: a citação. Por exemplo, na cena da discoteca em que Xiao Ji dança com Qiao Qiao eles não fazem mais que recriar a já mítica dança de John Travolta e Uma Thurman em Pulp Fiction. Ou já perto do final, quando Bin Bin vende dvd piratas, um dos títulos que tenta aliciar um conhecido a comprar é nada mais nada menos que Platform, o filme anterior de Jia.

O filme desenrola-se com a languidez da realidade. O autor dá-nos pequenos frescos da vida daqueles jovens, em casa, na rua, em clubes, as conversas e os silêncios de todos os dias. O espaço envolvente é, nalgumas cenas, esmagador, como quando nos mostra Qiao Qiao andando com o casaco sobre a cabeça, afastando-se dos blocos de prédios semi-acabados. A paisagem urbana é desoladora e enorme, impossível de escapar. Há muitos planos longos mas há sequências em que a câmara se move habilmente, em certos casos construindo ideias de repetição (as bofetadas na discoteca, as tentativas de Qiao Qiao sair do autocarro, o arrancar da moto), como repetitiva é a existência das personagens.

Unknown Pleasures é um filme extraordinário, que requererá um revisionamento para uma melhor apreensão de vários aspectos, tamanha é a riqueza do que mostra: poderíamos mesmo dizer que é a riqueza da realidade de um país em mutação. E um olhar nada doce, conquanto nunca cruel, dos jovens perdidos da China.
Helena F.