sexta-feira, fevereiro 08, 2008

Lust, Caution (Se, Jie)


China/Taiwan/Hong Kong/EUA, 2007, 157 min.

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Sinopse: Anos 40. Numa Xangai ocupada pelos Japoneses, Wong Chia Chi, uma tímida estudante junta-se a um grupo de teatro de esquerda e acaba a protagonizar um papel inesperado: o de Mak tai tai (a senhora Mak), uma elegante e abastada mulher encarregue de seduzir o senhor Yee, um político chinês colaborador dos invasores, que o seu grupo de colegas planeia assassinar como acto patriótico.


Crítica: Vencedor do Leão de Ouro no último Festival de Veneza, Lust, Caution assinala o regresso de Ang Lee à China, transpondo a história homónima de Eileen Chang. Tal como no filme anterior de Lee, Brokeback Mountain, também aqui a adaptação vai além do material literário que adapta, na medida que em sendo este relativamente breve, o filme apresenta vários acrescentos em termos narrativos, sem contudo perder a essência do livro.

Lust, Caution pode ser visto como uma história de espionagem e de resistência mas é, acima de tudo, uma história de perda de inocência e de descoberta do desejo. Wong Chia Chi aceita desempenhar o papel de uma mulher que não é ela e, nesse jogo de falsidade acaba por se descobrir a si. Pode-se estabelecer um curioso paralelo entre Wong Chia Chi/senhora Mak e a Rachel Stein/Ellis de Vries de Zwartboek, que vimos o ano passado nos cinemas. Ambas aceitam “dormir com o inimigo”, só para descobrirem nesse envolvimento uma estranha forma de vida. Porque de certa maneira é isso que a jovem estudante descobre com o dominador Yee: uma estranha forma de entendimento, uma experiência que a faz sentir viva. A descoberta do poder do seu próprio desejo que a leva a fazer tudo por ele.


No papel de Wong Chia Chi encontramos uma estreante, Tang Wei, que agarra o papel com notável empenho, transmitindo muito bem a passagem dos tempos de caloira hesitante à segurança do seu papel de sedutora. Como Yee temos um nome consagrado que dispensa apresentações, Tony Leung Chiu Wai, que consegue um transmitir de forma perfeita a ambiguidade da sua personagem: homem violento e dominador, e contudo capaz de momentos de uma fraqueza emocional camuflada, como o dar de mãos no clube japonês.
De entre o elenco destaquem-se ainda as prestações da veterana Joan Chen como a esposa do senhor Yee e o jovem Wang Lee-Hom como o líder do grupo teatral e o mentor do plano inicial para matar Yee.
A elegância e a sobriedade das interpretações prestam, de certa maneira, homenagem a ícones da Hollywood clássica, como comprovam as cenas em que a protagonista vai ao cinema ver filmes americanos.

Ang Lee é um realizador hábil. O enquadramento de cada plano é excepcional e o excelente trabalho de montagem revela-se crucial em algumas das melhores sequências do filme (como o jogo de mahjong inicial) demonstram bem o talento de Lee. O filme é de uma subtileza sublime. Até quando é explícito, é subtil. Ang Lee sabe que um quase imperceptível mexer de dedos, que um baixar de olhos, que um olhar mais fixo podem significar um infinito que é intraduzível, excepto por imagens. E ele dá-nos esse vislumbre, que é, em suma, a base para apreender a peculiar cumplicidade que por momentos se gera entre a espia e o político.


O filme é um prodígio a nível fotográfico – o director de fotografia é Rodrigo Prieto, habitual colaborador de Alejandro González Iñárritu – e de cenários, oferecendo as cenas de exteriores uma fascinante reconstrução da Xangai da época. Também o guarda-roupa, nomeadamente os figurinos da protagonista, são belíssimos. Mas a cereja em cima do bolo é mesmo a banda sonora. Alexandre Desplat, o mesmo compositor de Birth e The Painted Veil, brinda-nos com outra partitura extraordinária, com trechos de uma aguda melancolia que mereceram figurar entre os melhores escutados no cinema este ano.

Lust, Caution é uma das estreias fortes de 2008, e arriscaria mesmo dizer que se trata do melhor filme a estrear até agora nos cinemas portugueses. Um regresso em grande de Ang Lee. Imprescindível.


Helena F.

4 Comments:

Blogger Nuno said...

Helena,

Confesso que sou um cinéfilo de "trazer por casa". Vejo tudo o que é filme no conforto do lar através de uma "modernice" chamada DVD. Mas também confesso que este é um dos filmes que mais aguardo que saia no clube de vídeo mais perto de casa.
Depois de ler mais esta tua magnifica análise, ainda mais espectante fico...ainda por cima, com o meu actor asiático preferido...Tony Leung, Leão de Ouro...e realizado por Ang Lee.
Vai custar a passar o tempo..vai, vai.

5:23 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Não consegues mesmo vê-lo em cinema? Eu sou uma defensora das salas escuras e do ecrã grande, e nalguns casos acho que a experiência de visionamento sai particularmente beneficiada quando é feita em sala (este é um caso)...
Mas se não conseguires, vê-o em casa (já existe em dvd no estrangeiro, logo possível de ser adquirido via net). É um filme mesmo magnífico. E Tony Leung está magistral!

7:17 da tarde  
Blogger Nuno said...

Olá Helena,

Se fores ao meu blogg e abrires o post "Flagra", verás que faço uma referência a ti e a esta tua resposta.

Nuno

3:34 da tarde  
Blogger Sérgio Lopes said...

Acabei de o ver esta semana. De facto, é tudo o que a Helena referiu. Excelente análise de mais um magnífico filme de ang Lee.

12:27 da tarde  

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